Proposta 10

Como se escreve a carta de suicídio de um país analfabeto de si mesmo?

Mergulho em ódio, óleo e gasolina cada chumaço de algodão onde um dia plantei as sementes do grande pé de feijão. Ponte ao imenso futuro. Prometido, abolido, abortado.

Como se envelopa o destino de um país abrasado, despedaçado pelas aves de rapina que fincam as garras no solo, abrindo as veias da terra em profundas feridas?

Um professor me ensinou que é preciso aprender a arte de curtir a dor. Senti-la, abraça-la, degluti-la. Hoje eu busco a dor. Provoco lacerações e mutilações sutis com a esperança de voltar a senti-la. Agarrar o sofrimento abstrato do terrível e faze-lo carne.

Eu pensava vir um dia a dispor da leveza gilbertista de fazer brotar lágrimas nos óculos escuros de quem dirige rápido demais pelas baixadas dos Glicérios.

Mas, no final das contas, nunca escreveram “amor” na faixa da bandeira nacional.

Como se assina a carta de suicídio de um país que sequer se encontra nas dobras do seu território, nas cores dos olhos, pele, boca, que não se compreende no próprio idioma e segue traduzindo-se em péssimo inglês.

Se eu ainda tivesse garganta pra gritar, eu cortaria o mal pela jugular, tossindo o nome dos 800 mil bois de piranha que cruzaram o rio de sangue que cruza o continente de ponta a ponta. Não há sossego no pôr do sol, não há beleza no fim do dia, não há descanso no final da ladeira: é que nunca escreveram “amor” na faixa da nossa bandeira.

Pra quem se envia a carta de suicídio de um país que não pertence a si mesmo? Que não tem comprovante, nem residência, nem remetente, nem ministro da saúde e antes não tivesse presidente.

Como se queima a carta de suicídio de um país já menos brasa que carvão e cada dia mais cinza?

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